terça-feira, 4 de agosto de 2009

O dia em que o Zé (não) morreu



Sou moradora de Cachoeirinha há vinte anos e, nunca, jamais, presenciei tamanha comoção quanto na última sexta-feira, dia 31 de julho de 2009. A notícia atravessou as calejadas calçadas da avenida Flores da Cunha, espalhou-se, com alvoroço, pelos bairros e vilas da cidade, adentrou, na velocidade da luz, os fóruns de discussão em comunidades e caixas de e-mails: o Zé, personagem conhecida não só por graxains, mas por habitantes de cidades vizinhas, tinha falecido naquela madrugada.
Fiquei sabendo do fato através da internet, numa comunidade em um site de relacionamentos. Logo depois, uma amiga comentou, outro disse aqui, outro acolá, e, até então, ninguém sabia as circunstâncias que levaram à morte do Zé. Contudo, a manchete já foi o suficiente para entoarem hinos de louvor e nostalgia ao ilustre andarilho, além da coletiva descrença na notícia, pois, como todos nós acreditamos, o mito jamais morre.
Sexta e sábado foram dias angustiantes, à procura de provas, indícios ou comunicados oficiais sobre o falecimento. Já na sexta feira, algumas informações circulavam no boca-a-boca e, eis que no domingo, os rumores davam conta de que o Zé não tinha morrido, apenas tivera um problema de saúde e estava bem.
Enfim, até o momento em que escrevo, a controvérsia permanece, e vejo as pessoas ansiosas por notícias do Zé. Entretanto, o que me leva a escrever é o efeito do boato/notícia na vida social da cidade e a figura do Zé como um aspecto de identidade do nosso povo. Sobre a primeira questão, um pouco já debatida anteriormente, é oportuno salientar a mobilização de todos para averiguar o que teria acontecido, cooperação essa que deve estar à serviço de outras demandas da comunidade, como, por exemplo, junto ao poder público.
Para chegar à segunda questão, retomo um tema sobre o qual já escrevi em outro artigo, a riqueza da oralidade. A história toda do Zé lembrou-me muito a pesquisa que tenho desenvolvido sobre as lendas urbanas da cidade e me fez acompanhar e pensar desde a “manchete”, a qual origina e desencadeia toda a construção fabular do episódio. Como ainda não se sabia sua resolução/desfecho do conflito, várias hipóteses pairavam nas ruas da oralidade, algumas fantásticas, como a de que ele, aos moldes de Cristo, teria morrido na sexta e ressuscitado no domingo. No artigo anterior, esbocei o comentário de que a capacidade simbólica das narrativas populares é ingrediente fundamental na construção identitária da cidade, e o Zé personifica outro elemento popular, o mito. Não há quem não conheça alguma frase ou episódio pitoresco dele, e reconhece sua importância, ainda que simbólica, para a cidade, ao elevá-lo dizendo que ele é o filho mais ilustre, o imortal, a celebridade cachoeirinhense. Numa terra em que não temos um conciso registro histórico de suas origens, nada mais evidente do que eleger o simpático errante, que vaga por vários espaços da cidade, sem destino certo, cumprimentando todos, como personagem mítico do folclore local.
Há muitas outras questões a serem discutidas, e a figura do Zé pode despertar para a reflexão sobre nossa indiferença com o outro, por exemplo. No entanto, aqui me dispus a registrar, no breve relato e reflexão pessoal, as impressões daquele dia em que o Zé (não) morreu.

Ana Paula Cecato

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Roda de Histórias no Seminário "Ao pé do ouvido"


Medo, crença, perigo, surpresa foram algumas das sensações partilhadas durante a roda de histórias que aconteceu durante a programação do Seminário de Contadores de Histórias Ao pé do ouvido, no último dia 10. Comecei contando um pouco da trajetória da pesquisa, dos relatos escritos nas comunidades do Orkut e por e-mail, além daqueles coletados oralmente. A seguir, os presentes leram as lendas já publicadas no blog e comentaram se conheciam ou acrescentaram algum detalhe. Podemos estabelecar aproximações entre algumas histórias, como a de Solano e do Diabo Loiro, com outras que existentes em outros lugares, como a lenda do Boto, contada na região Norte do país. As histórias de noiva também tiveram destaque (muitos conheciam a da Noiva do Bosque) e, sobre a história da Noiva do Ritter, a qual aparece aos caminhoneiros pedindo carona até o cemitério municipal, há uma outra semelhante, que acontece nas proximidades da cidade de Santo Antônio da Patrulha, à beira da autoestrada Freeway. Outras lendas foram narradas e cada uma foi registrada e, nos próximos dias, pretendo postá-las aqui.

*Na foto, a atriz Rosane Castro contando histórias.

Lenda 4: Diabo loiro ou diabo da lambada*

O diabo loiro ou diabo da lambada era um rapaz que frequentava as festas do Studio 59, na década de 80, em Cachoeirinha. Conta-se que ele se aproximava de uma jovem, conversava um pouco e a levava para um canto. Rapidamente, o rapaz tirava de dentro do casaco uma garrafa, onde tinha ácido e jogava na moça, queimando seu corpo. Dizem, também, que ele entrava no banheiro feminino da danceteria e fazia a mesma coisa. Depois de atacar suas vítimas, o moço desaparecia no banheiro e nunca conseguiu ser localizado.

*Lenda recontada na Comunidade Cachoeirinha City.

domingo, 5 de julho de 2009

Lenda 3: A velha da 1° de maio*

Faz anos que moradores do bairro Veranópolis contam histórias curiosas sobre uma sinistra idosa que mora em uma casa, sem energia elétrica e caindo aos pedaços. Vou contar a experiencia de um amigo...

Faz uns 10 anos e ele e alguns amigos estavam jogando bola na rua... Um deles chutou a bola para dentro do pátio da velha, quando entraram no pátio para buscar a bola, a porta da frente abriu levemente, (a casa toda escura por dentro) e foi possivel escutar som de piano... Os meninos, assstados, pegaram a bola e saíram correndo...
Alguns dias depois, eles viram a tal velha sair de casa... Então decidiram ver o que tinha lá...
Pois bem, entraram no pátio, mas a casa estava toda trancada. Porém, na porta dos fundos da casa, dava pra ouvir o som de piano tocar. Detalhe: não havia ninguém lá e a casa, muito velha, não era do tipo que pode ter um piano dentro...
Eu morei naquela rua e tenho que concordar que aquela mulher é, no mínimo, assustadora!

Não sei sua origem, sua história, e nem se ela é viva ainda. Só sei que ela mora ou morava (faz uns 5 anos que não vou pra lá) em uma casa aos pedaços, sem energia elétrica... E que os morados mais antigos falam que ela é uma bruxa ou algo assim...


*Lenda contada por Jonatan, na comunidade Cachoeirinha City, no site de relacionamentos orkut.

sábado, 4 de julho de 2009

Lenda 2: A noiva do bosque*

Conta-se que no bosque Tancredo Neves, aos fundos da escola São Mateus, há aparições de uma mulher vestida de noiva (mulher de branco).
No dia do seu casamento, já vestida para cerimônia, a noiva recebeu a visita de seu noivo enfurecido. Ele havia descoberto a traição de sua futura esposa e não a perdoaria. Para se proteger, ela correu em direção ao bosque. Ele pegou um facão e saiu à sua busca.
Ao chegar à longa descida até o lago, no centro do bosque, ela escorregou e rolou, até cair no lago. Seu noivo a alcançou e, de um só golpe, arrancou sua cabeça com o facão.
Dias depois, a polícia encontrou o corpo boiando no lago, mas a cabeça e o noivo nunca foram encontrados.
Dizem que ele escondeu a cabeça dela no buraco de uma árvore. Às vezes, a qualquer horário do dia, ela é vista procurando a sua cabeça, à beira do lago.

*Lenda urbana recontada por Rafael Nunes

sábado, 20 de junho de 2009

Contando uma lenda urbana...

Lendas urbanas são pequenas histórias de caráter fantástico ou sensacionalista, amplamente divulgadas de forma oral e, mais recentemente, pela Internet. São, em geral, narradas como sendo fatos acontecidos a um "amigo de um amigo" ou de conhecimento público.
Muitas delas são bastante antigas, tendo sofrido pequenas alterações ao longo dos anos. Outras foram traduzidas e incorporadas de outras culturas.
As principais características das lendas urbanas são:
- forma narrativa - em geral, trata-se de histórias curtas e bem estruturas.
- o narrador tenta dar veracidade ao que conta, referindo-se a testemunhas e provas supostamente existentes;
- em geral o narrador ouviu a história de alguém, mas, quando a reconta, é comum que diga que aconteceu com ele ou com um conhecido.

*Retirado da página do projeto Vamos Ler, no jornal Diário de Cachoeiirnha, em 19/06/2009.

Lenda 1: O rapaz que dança

Conta-se que, de vez em quando, aparece, nas festas de Cachoeirinha, um rapaz de uns 24 anos, com mais ou menos 1,70m, gel nos cabelos, bonito e muito, mais muito simpático, que diz se chamar Solano.
Ele chega vestido de preto, com uma argola de ouro na orelha esquerda, um colar no pescoço e um perfume muito bom, e cumprimenta todo mundo. Logo, acende um cigarro, tira um moça para dançar e vai para o meio do salão, onde fica dando voltas com ela por bastante tempo. Algumas moças que dançaram com ele dizem que o rapaz é simplesmente gelado, e seu beijo, frio. E que, durante a dança, não sentiram nada diferente, à parte de sua frieza, mas, ao chegarem em casa, tinham as mãos e a cintura doloridas, como se tivessem sido queimadas ao serem tocadas por ele.
Os moradores mais antigos da cidade dizem que Solano morreu com várias facadas nas décadas de 60 ou 70, defendendo a namorada numa festa e que, quando dança pelo salão, podem ser vistas, em alguns momentos, dependendo da intensidade da luz, as marcas em seu corpo.
Alguns dizem que ele atrai as moças para provocar seus namorados, querendo achar os culpados pelo assassinato de sua amada; outros, que ele simplesmente trata de encontrá-la.


*esta lenda foi publicada no jornal Diário de Cachoeirinha, na página do projeto Vamos Ler, http://vamoslercachoeirinha.blogspot.com, em 19/06/2009.